quarta-feira, 31 de março de 2021

 

RAIVA

 

escondida

camuflada

de você

de mim

do outro

do mundo.

 

Ela foi treinada a engolir a raiva.

Embora tenha tido vários ataques de raiva durante a infância e a na adolescência.

Na vida adulta foi aprendendo que a raiva deve ser contida.

E ficou boa nisso.

Reconhecida por ser calma, ponderada e conciliadora.

Tem se saído bem.

Elogiada.

Quando fica possessa de tanta raiva, se tranca no quarto, resmunga, chora e soluça.

Pouquíssimas vezes, se dá ao luxo de gritar, quebrar o que está na frente ou partir para a briga.

Acho que ela nem lembra mais como é isso.

Afinal raiva do chefe, dos filhos e do marido, precisa ser engolida.

Melhor assim!

Deixar esfriar!

Perder o emprego nesse momento difícil? Deixa disso!

Engolir um sapinho? Mole para nós!

Brigar com filhos? Nem vale a pena! Afinal o motivo por que eles brigam hoje ela já conhece desde os vinte anos.

Vão crescer!

Brigar com o marido? Esse sim!

Bagunceiro, desorganizado, espalha coisas pela casa (livros em cima da mesa, toalha molhada no chão do banheiro), perde a chave do carro, esquece de pagar a conta...

Gastador, nem se preocupa com a conta no vermelho.

Acumulador, jamais joga algo fora.

E sempre de bom humor!

Que bom humor é esse?

Que raiva ela sente desse bom humor.

Ela tem toda a razão de ter muita raiva.

Ele é insuportável.


MINHA CASA


Da minha janela
vejo bananeiras
No porão
nascem avencas
No jardim
antúrios escarlates
desavergonhadamente
amam

 


ARVORO-ME

Que mensagem você quer me passar? Apenas uma palavra num pequeno papel.

“Arvoro-me”

Palavra estranha essa, não faz parte do meu vocabulário e desconheço o significado.

Assumindo a minha ignorância, vou para o dicionário e busco decifrar o enigma.

Vem do verbo arvorar.

Mais confusa fico com os significados.

Plantar arvores (arborizar), erguer verticalmente, içar, desfraldar, hastear, parar de remar, ostentar, exibir...

Busco dentro de mim um significado.

Como uma arvore, presa à terra, ergo-me em direção ao céu.

Meus galhos hasteados.

O vento forte me impede de remar e é preciso arvorar.

Ostento poderosamente a semente germinada.

Desarvoro-me.

Completamente desnorteada, confusa e sem rumo.

Fujo do entendimento.

Lembro de Clarisse:

“Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento.” (Clarice Lispector)

domingo, 21 de março de 2021

MEU CADERNO DE BORDO 1 - CONSTELAÇÃO DE REFERÊNCIA LITERÁRIA 

Recebi um convite  da minha mentora em biblioterapia Cristiana Seixas para criar um caderno de bordo. Ela sugeriu que iniciasse meu caderno fazendo uma homenagem a dez escritores que admiro.

Então,  fui até a minha estante e alguns livros pediram para sair. Os mais sociáveis e expansivos, mas também os que estavam ansiosos para dar uma voltinha. Alguns tímidos ficaram. Eles terão a sua vez.

Escolhi dez livros que foram importantes em algum momento da minha vida.

Provavelmente, quem está lendo esse blog agora, também tem os seus.

Pode ser que os meus escolhidos não digam nada para você. Às vezes um livro fala muito para uma pessoa e nada para outra.

Então, esses são alguns livros que falaram com a minha alma. Quando os li saí diferente do que era.

  • 1.      A hora da estrela - Clarice Lispector

“Não, não é fácil escrever. É duro como quebrar rochas. Mas voam faíscas e lascas como aços espelhados.”

  • 2.      O amor nos tempos do cólera – Gabriel García Marques

“...os seres humanos não nascem para sempre no dia em que as mães os dão à luz, e sim que a vida os obriga outra vez e muitas vezes a se parirem a si mesmos.”

  • 3.      O conto da ilha desconhecida – José Saramago

“Se não sais de ti, não chegas a saber quem és.”

  • 4.      O profeta – Khalil Gibran

“Vossos filhos não são vossos filhos. São os filhos e as filhas da aspiração divina pela vida. Vêm por vosso intermédio, mas não de vós.”

  • 5.      A história de Fernão Capelo Gaivota – Richard Bach

“Podemos ser livres! Podemos aprender a voar!”

  • 6.      Mulheres que correm com os lobos – Clarissa Pinkola Estés

“...ser nós mesmas faz com que nos isolemos de muitos outros e, entretanto, ceder aos desejos dos outros faz com que nos isolemos de nós mesmas.”

  • 7.      Apontamentos da história sobrenatural – Mário Quintana

O velho do espelho

“Por acaso, surpreendo-me no espelho: quem é esse

Que me olha e é tão mais velho do que eu?”

  • 8.      Livro do desassossego – Fernando Pessoa

“Se o que eu deixar escrito no livro dos viajantes puder, relido um dia por outros, entretê-los também na passagem, será bem. Se não o lerem, nem se entretiverem, será bem também.”

“Tudo me interessa e nada me prende.”

“Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir.”

  • 9.      A rosa do povo – Carlos Drummond  de Andrade

Carrego comigo

“Não estou vazio,

Não estou sozinho,

Pois anda comigo

Algo indescritível”

  • 10.  Confesso que vivi – Pablo Neruda

”... direi que a loucura, certa loucura, anda muitas vezes de braço dado com a poesia. É tão difícil as pessoas razoáveis se tornarem poetas quanto os poetas se tornarem razoáveis.”

 

 Em breve, tiro os tímidos da estante.

 

 

 

 

segunda-feira, 15 de março de 2021

 


A vida em aquarela

 

Hoje, as minhas relações com aqueles que me cercam são mais leves.

É como o pincel deslizando pelo papel branco da aquarela, carregando consigo água e cor.

Essa é a leveza que estou aprendendo.

Da aquarela para a minha vida.

Diante do agora posso fazer qualquer coisa.

O momento é apenas uma folha de papel.

Desenho o que acredito ser belo, mas principalmente algo

que fale ao meu coração.

Escolho cor e alegria.

A água escorre e se deixa absorver.

A lágrima brota.

A emoção já não cabe mais dentro de mim e preciso transbordar.

Cor e água.

Alegria e emoção.

Absorvendo, criando e sentindo.

Surge a imagem que traz felicidade.

Surgem as relações que me fazem feliz.

Relações sem amarras, livres, para serem o que quiserem.

Até que um dia percam a cor.

Até descolorir.

 

12-07-2015


 Escrever é para já

 

Quando vier a ideia, corre, pega o lápis e o papel. Anota.

Não esperes. O tempo corre e as palavras são escorregadias.

As palavras se juntam rapidamente e formam frases e textos.

Dizem o que se passa na alma naquele momento.

E aqueles sentimentos que pareciam inatingíveis, brotam e se mostram.

E lá está você.

Que parecia não existir.

Que tinha sido engolida pela rotina.

Se demorar e deixar para amanhã.

Pronto, as palavras resolvem sair por aí.

Cada uma para o seu canto e para lugares tão diversos.

Não formam frases, nem textos, nem poesia.

Não dizem mais nada e já não o representam.

Não é mais você.

É preciso ter um bloquinho de papel, caneta ou lápis sempre bem próximo de ti.

Sempre prontos para o uso.

As palavras são rápidas demais e é preciso estar atento.

 

09-10-2015

sexta-feira, 5 de março de 2021

 Assim começa a minha história com a escrita.

 

Vou contar para vocês um pouco da minha história e como aconteceu o meu despertar para a escrita.

Desde pequena sempre gostei de ler e na adolescência escrevia cartas e desabafos em caderninhos.

Como médica, continuei a ler muito, mas escrevia apenas textos técnicos relacionados com a minha profissão.

Sentia falta de algo.

No dia oito de novembro de 2014 conheci a psicóloga Cristiana Seixas (www.crisseixas.com.br) no Fórum de Humanização do Viva e Deixe Viver (www.vivaedeixeviver.org.br). Eu participava de um curso de formação de voluntários para contar histórias para crianças e adolescentes em ambiente hospitalar. Aliás, ser voluntária foi uma experiência inesquecível para mim. Quando lia para uma criança e conseguia faze-la sorrir e esquecer da dor, eu também ficava mais leve. O remédio da leitura também fazia efeito em mim.

Foi no curso de formação de voluntários que conheci a Cris. Fiquei fascinada com aquela mulher magra e alta que declamava poesia com tanto encantamento. Senti uma emoção, como há muito tempo não sentia.

Ela falou de “biblioterapia”, palavra para mim até então desconhecida. Não imaginava que alguém poderia se tratar com livros.

Fiquei tão curiosa, que no intervalo das palestras corri para ser a primeira a comprar o seu livro.

Seu livro passou então a ser meu livro de cabeceira, rabiscado, com pontinhas dobradas e algumas anotações.

Algum tempo depois comecei a frequentar os círculos de biblioterapia, onde conheci pessoas que amam ler e escrever. Pessoas extremamente corajosas que deixam fluir as emoções despertadas pelas palavras.

No final do ano de 2015, publicamos nossa primeira antologia “Gavetas Acesas”. A biblioterapia despertou dentro de mim emoções que estavam guardadas há muito tempo. Me ajudou a abrir as minhas gavetas.

Publico agora nesse blog as minhas primeiras escritas mediadas por esse processo. Hoje colho, mas também semeio.

 

 

 


 

 

 

 

  Em busca da cura     O ciclo se repete, mas eu continuo viva. Como é difícil me aceitar, imperfeita, dissimulada e tão errante. Co...