A Ametista e o beija-flor
No longínquo e rochoso mundo mineral, onde
habitavam as pedras preciosas, o rei Diamante com firmeza e austeridade
comandava os seus súditos. Todas as pedras lhe obedeciam e mantinham suas
características de brilho, cor e dureza. Fraturas e variações não eram
permitidas. E assim, rubi, safira, esmeralda, água marinha, turmalina, granada,
ametista, topázio e turquesa aguardavam petrificadas o momento mágico da
extração, quando seriam finalmente lapidadas.
A
ametista tinha uma estranha afinidade com a esmeralda, ambas gostavam muito de
ler.
Ametista lendo, descobriu o significado do
seu nome “não intoxicar” e ficou sabendo que poderia ser usada como amuleto
contra a embriaguez. O livro de
mitologia fazia citação ao seu nome, seria ela uma ninfa transformada em
cristal transparente para se proteger do assédio de Baco, e ele por puro
deleite mergulho-a no vinho mudando a sua cor para violeta. Ela ria e se
divertia, imaginando o quanto de coisas ela poderia ser.
Esmeralda se gabava de ser a deusa verde
de todas as pedras, pedra do amor, da fertilidade e da reencarnação para os
egípcios, que a usavam nas múmias com a esperança da juventude eterna. Também
os gregos a relacionavam a Afrodite, a deusa do amor.
Ametista e Esmeralda não sabiam
exatamente o que era o amor, mas sabiam ler e desejavam ardentemente conhecer o
mundo exterior. E durante muitos anos a leitura bastou para as duas.
Numa manhã, o rei Diamante saiu do palácio
para fazer sua inspeção, queria verificar se todas as pedras encontravam-se nos
seus devidos lugares, protegidas da luz do dia e do aquecimento que poderiam
danificá-las. De repente, ouviu uma
risada alta e espiando para o interior da jazida, viu Ametista lendo para
Esmeralda. O rei Diamante que nunca havia aprendido a ler, não conseguiu esconder
a sua inveja.
Elas com medo fecharam imediatamente o
livro e abaixaram a cabeça numa postura de submissão. O rei furioso começou a crescer, crescer,
crescer... A ira o transformou em um gigante avermelhado e pequenas fraturas
começaram a surgir. Num estrondo jamais ouvido, o rei Diamante se despedaçou e
todo o reino mineral se desorganizou.
Duas lascas acertaram as pedras leitoras e
curiosas. Ametista e Esmeralda foram transformadas.
Ontem mesmo, buscando inspiração para a
minha escrita, observava a natureza e esperava um sinal. Quando vi, dançando na minha frente e
rapidamente parando no ar, um beija-flor, muito pequeno, coberto de escamas de
verde esmeralda e com a cabeça violeta. Ele beijava intermitentemente uma ametista,
atraído talvez pela cor, o cheiro ou o sabor. Seja lá o que o capturou, ele se
tornara prisioneiro do prazer proporcionado por aquela flor.
A flor e o beija-flor enfeitiçaram o meu
pensamento por horas e dias e fiquei imaginando que aquele pássaro não era
apenas um beija-flor e aquela ametista não era apenas uma flor.